quarta-feira, 26 de novembro de 2008

Avatar

Lúcia,

Pudesse ver os teus cílios de fome. Saudades da tua cara lavada, alva de lábios finos e sedentos de hibiscos. Adoro teus cabelos soltos nesse louro forçado, no embaraço em meus anéis de histórias e ventos.

Ah! Teu corpo pequeno e louco, precisamente branco no dialeto de nossos copos... (frase tão óbvia para quem deseja escrever um livro). Os loucos, Lúcia, comem a carne do verbo. São, apenas.

Comprei uma prosa de Hilda, Estar Sendo. Ter Sido. Sinto-me , Lúcia, na catarse de um gozo nesses dedos de mentiras. Fodida, persigo a distância de um dia — de olhos que nunca mais verei como um sorriso falso de bijuteria. O brilho idiota de ser; a rosácea fingindo o dia colorido.

Hoje tenho o sabor de procriar engodos nas coxas e escrever-te híbrida ao trago do vício.

Tantos pontos e vírgulas jamais me dirão... tu que bem me conheces guarda-me no teu silêncio irritante (sabe-me mais flores que as baladas da terra). Guarda-me memória no teu licor.

Peço-te, Lúcia. Deite-me inverno, não mo deixes esquecer o perfil perfeito, aquele dia liso. Não mo deixes esquecer o toque escorrido de um laço desfeito na nuca e o gemido dos incensos.

Não mo deixes esquecê-lo.

Porque a verdade, Lúcia, está sempre presente num gole de cinzas.

_____

Imagem: Avatar, Ana Magalhães, 2008

Nenhum comentário: